quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Capítulo 1


— Vou virar lésbica.
— Como é????
Não vejo alternativas para minha pessoa. Meus relacionamentos são sempre recheados de caos, incertezas e o pior: traições. Por que sempre atraio tipos assim para minha vida? É carma, sina, macumba… é trabalho feito, só pode ser!
Nauane, minha melhor amiga, bate com o copo na mesa e me encara, efusiva. Sei que ela gritará verdades na minha cara e não estou a fim de sermões hoje. Ajeita a franja castanha para o lado e estreita os olhos, mirando-me bem lá no fundo.
— Nem vem, não quero ouvir. – balanço as mãos, defendendo-me de sua fúria sábia.
— Caramba, Demi. Se você me escutasse, não se meteria com tipos como o Roger. O babaca é um pegador, um galinha filho da mãe e ainda assim, você assumiu o risco. Para piorar a situação, deu-lhe um chute no saco e quebrou o nariz do cara, no meio de uma reunião importante para a agência. Perdemos o cliente e você a compostura e o emprego. – ela para e respira antes de arrematar: – Porra, você tem merda na cabeça?
— Nanie, não me crucifique. – jogo a cabeça para trás, entregando os pontos. – Você tem razão em tudo e eu a odeio por isso.
— Claro que me odeia, sou sua amiga e digo as verdades na sua cara!
— Droga, Nanie, o que farei da minha vida agora? – encolho os ombros, batendo com a testa na mesa do Starbucks. – Como pude ser tão burra?
Burrice ao quadrado é minha marca registrada desde os doze anos de idade. Esse traço marcante da minha personalidade estourada e um tanto desequilibrada, já me meteu em altas confusões. Algumas até bem sérias que acabaram por ferir a minha alma.
O que eu tinha na cabeça para acertar o Roger daquela maneira ao final da reunião? Nem sei se realmente estou apaixonada pelo cara! Agi de forma intempestiva, sem pesar as consequências. E agora, pagarei em dobro por tamanha estupidez.
— Aproveite a demissão por justa causa e tire umas férias. Vá visitar o seu velho, passe um tempo com seus avós. Fará bem a você. – Nauane se desarma e toma minhas mãos entre as suas. –Demetria, enquanto você respirar, sempre haverá uma saída.
— Belas palavras. – deixo um sorriso lacônico escapar. – Sei lá, acho que Deus desistiu de mim. Não tenho salvação, Nanie.
— Ah, cale a boca, também não precisa ser tão dramática. – Nanie recosta na cadeira e suspira alto. – A indenização vai acabar com suas economias, já pensou no que vai fazer?
    Que saco. – chacoalho a cabeça, descrente. – E nenhuma agência de São Paulo receberá meu currículo depois do que aprontei. Cavei minha própria sepultura e me atirei de cabeça.
— Nada que o tempo não resolva.
— Talvez eu deva mesmo ir para Paraty. – digo, resoluta. – Ajudar os velhos na pousada, chorar no colo do meu pai, curtir uma solidão à beira mar... não será de todo o mal. Mas é melhor eu deixar meu revólver por aqui, ou atirarei nas têmporas na primeira oportunidade.
— Melodrama barato esse. – Nanie revira os olhos, no maior tédio. – Sabe que pode sempre contar comigo, não sabe? – ela enfatiza.
— Obrigada, Nanie. É muito bom ter você na minha falida vida.

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