quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Capítulo 35


Capítulo 35 Mini maratona (1/6)


Demi não tinha nenhuma pressa por acabar de trabalhar. Olhou o relógio, viu que eram seis e dez e logo que pôde encontrou forças suficientes para mover-se.
— Bom, é fantástico te ter de volta, Lovato. Mas já vou-me — disse Liam depois que lançava um último livro sobre sua mesa.
— Que tenha uma boa noite — despediu-se Demi.
— Com certeza que a terei — respondeu o menino com um amplo sorriso.
— Oh? Um encontro interessante?
— Poderia dizer que sim. Por que está ficando? Vai ajudar com o ensaio?
— Que ensaio?
— Blanda vai organizar o lugar para o baile de gala. Uma espécie de ensaio geral. Pensei que talvez você tivesse sido escalada para ajudá-la.
— Oh, Deus, ainda não. Mas obrigado por me avisar. — Colocou apressadamente as coisas na bolsa e anunciou: — Vou com você.
Desceram as escadas até o saguão de entrada e notaram uma antecipação do calor e a umidade que os esperava lá fora.
Havia gente sentada nela, embora menos que na hora do rush do almoço. A calçada da Quinta Avenida estava lotada de pedestres que corriam para Grand Central Station e Demi sentiu pavor pelo caloroso trajeto do metro que a aguardava.
— Até mais tarde, Lovato — gritou Liam, enquanto se desviava para o sul.
Estava ao ponto de lhe dizer adeus, mas as palavras ficaram presas na garganta quando viu o Mercedes preto estacionado do outro lado da rua.
“Você pode simplesmente virar para a esquerda, para a estação de metrô”, pensou. E isso foi o que fez. Infelizmente, Joe a conhecia o suficiente bem para saber para onde se dirigia. E com suas longas pernas chegou lá antes dela e a interceptou na esquina da Quarenta e dois com a Quinta.
— Não atende o telefone — disse, colocando-se bem na frente dela e bloqueando o seu caminho. Demi não se permitiu olhá-lo nos olhos. Se o fizesse, estaria perdida.
— Refere a este? — perguntou, enquanto tirava o iPhone da bolsa e o entregava. Não o tinha ligado em três dias. Joe se negou a pegá-lo.
— Pode falar comigo um minuto? — perguntou.
Demi sabia que deveria seguir andando, mas em lugar disso olhou para ele. A visão daqueles aveludados olhos pretos e aquela boca tão masculina a afetou de tal maneira que ficou petrificada, incapaz de mover-se. Joe interpretou seu silêncio como um sim.
— No carro? — voltou a perguntar.
— Não vou entrar no carro. Olhou a seu redor, claramente incômodo.
— Vai ser difícil falar aqui.
Como mostrando que tinha razão, um homem de terno golpeou Demi com sua maleta.
— Vou me arriscar a ser atropelada pelas pessoas — respondeu. — Fale por você mesma — ele comentou com um leve sorriso.
Algo se mexeu em seu interior. Amava-o, que Deus a ajudasse, mas manteve sua expressão impassível. Joe voltou a olhar a seu redor e passou a mão pelo cabelo. Demi seguiu seu olhar até o outro lado da rua e viu que seu chofer tinha dado a volta no quarteirão e nesse momento estava parado na rua Quarenta e dois entre o Madison e a Quinta.
— Bem — ele cedeu — Você ganhou. Vamos falar aqui.
Pegou-a pelo cotovelo e a aproximou do edifício. Ela se apoiou em uma vitrine e o olhou aguardando.
— Meu pai deixou a minha mãe por uma modelo de vinte anos, uma garota que tinha três anos a mais que eu. A princípio, odiei-a, mas no final fizemos uma trégua e nos tornamos amigos. Levava-me às sessões fotográficas e aí é onde me interessei pela fotografia. Deixou que eu praticasse com ela. Mas no final deixou o meu pai, ironicamente por um fotógrafo. Então, o dano já estava feito minha mãe, que nunca se recuperou da aventura de meu pai e do divórcio, se suicidou.
— Quem era a modelo? — perguntou Demi, enquanto as imagens da exposição do Joe na galeria vinham a sua mente como uma onda não desejada. E soube qual era a resposta.
— Camilla Belle. As palavras que confirmavam suas piores inseguranças sobre seu relacionamento foram como uma bala. O deles era um mundo que acabou e seu interesse por ela não podia ser mais do que uma distração passageira. 
— Eu aprecio... a...informação. De verdade. Gostaria que me tivesse contado estas coisas num momento em que poderíamos estar sentados na cama falando durante horas, nos conhecendo mutuamente. Mas agora já não sei o que deveria fazer com ela.
Os táxis buzinavam, as pessoas seguiam passando junto a eles e o calor e a umidade pesavam como se fossem um manto. Mas Demi não queria se mover; não queria que ele se fosse e, sem dúvida, não desejava regressar de metrô ao seu apartamento para passar outra noite desejando-o. A quem queria enganar ao pensar que ficando fora do carro ia evitar que sua resolução e indiferença caíssem como peças de dominó?
— Vamos conversar. Jante comigo.
Ela não desejava jantar. Desejava sentir o doce ardor da corda ao redor dos pulsos, o ar frio do quarto que nunca tinha visto, a intensa dor nas coxas, o explosivo alívio de seu membro entre as pernas.
Ela virou-se e caminhou para a entrada da estação.
— Espera. — Joe a pegou pelo braço e ela permitiu-o parar.— Não quer mais fazer isto, de acordo. Tenho que aceita-lo. Mas não me rejeite como se tivesse feito algo mau. Nunca menti para você. Não te deixei. Está zangada porque acredita que não posso te dar o que quer.
— Pode?
— Não sei — reconheceu. Parecia inclusive mais triste admitir o que ela tinha sentido nos últimos dias para perceber. — Mas vim aqui para falar com você porque quero tentar.
— Tentar como?
— Não sei — repetiu. — Eu pensei que você disse que queria conversar.
— Não é tão fácil — protestou Demi. — Eu também estou pensando que possivelmente eu não posso te dar o que você quer.
— Mas dá.
— Por enquanto — ela acrescentou.
— É por querer te fotografar? Demi mordeu os lábios, odiando ter que reconhece-lo inclusive para si mesma.
— Pode me dizer que não se importa? Que pode estar com uma mulher que não tem interesse em ser sua musa?
— Mas aí é onde você se engana, Demi. Você é minha musa, você é. Penso em você cada vez que faço uma foto. Vejo-te em cada rosto, em todos os corpos que fotografo. O número de outubro de W deveria levar seu nome na capa. A única coisa que te peço é que me deixe ver o que acontece quando ponho à mulher que de verdade me inspira diante da câmara. Ela pensou nas imagens em branco e preto das paredes de seu apartamento, mulheres com cordas, sob o chicote, nuas e imortalizadas num momento de desumanização de Joe.
— Não posso — repetiu.
— Confiou em mim em todos os sentidos. Você mal hesitou. E vai fugir porque tem medo que eu a fotografe?
— Parece ruim quando você fala assim. “Limite intransponível”, pensou.
Ela virou-se e entrou correndo na estação de metrô.
                                             ***

O rosto da Demi era um desastre, estava inchado e cheio de lágrimas quando colocou a chave na porta de seu apartamento. Chorar no metrô devia ser uma nova forma de chegar ao fundo do poço. Ou talvez a mulher não fosse uma verdadeira nova-iorquina se não se desmanchasse totalmente no metrô em plena hora do rush.
Entrou no apartamento e se consolou pensando que o refúgio de seu quarto estava a segundos de distância.
— Onde esteve? — perguntou Selena, surgindo na frente dela como se fosse uma aparição excepcionalmente bem vestida.
Usava o cabelo loiro preso em um descuidado coque na nuca e um vestido amarelo de verão que ficava perfeito com seu leve  
bronzeado. Passou gloss nos lábios e blush suficiente para dar ao seu rosto um brilho rosado. Mas nenhuma destas coisas era o motivo pelo qual Selena estava mais bonita que nunca. Demi se deu conta de que não era o bronzeado, nem a maquiagem perfeita ou o vestido. Era porque, pela primeira vez desde que Demi a conhecia, Selena Gomez parecia verdadeiramente feliz. 
— Onde sempre estou até as seis, trabalhando — replicou.
Então ela percebeu de que não estava sozinha no apartamento.
Um jovem pulou do sofá. Tinha o cabelo loiro avermelhado e covinhas. Usava uma camiseta do Dartmouth e uma calça cáqui e a saudou com um sorriso caloroso. Mais que bonito era lindo.
— Oi, Demi. Prazer em conhece-la finalmente. Sou Justin Miller.
— Você é.. Justin? — perguntou ela. Aquele era o galã? O homem que converteu Selena num mar de lágrimas durante dias e dias?
— Estávamos esperando por você — interveio Selena, enquanto segurava a mão de Justin. Demi não sabia como no decorrer de uma tarde, Justin conseguiu aparecer na vida de Selena e estar na sua sala como se ele tivesse morado sempre aí e ela fosse a visita. Tinha vivido tão concentrada em seu próprio drama com o Joe que não se inteirou de que sua companheira havia — como ela o teria exposto? — fechado seu trato com Justin?
— Nós convidamos um amigo de Justin, Andy, para beber alguma coisa, e queremos que se junte a nós. Oh Deus, um encontro às cegas? Selena devia estar tão enevoada por sua nuvem de amor, porque era evidente que não tinha percebido de que Demi apenas estava em condições de escovar os dentes e ir para a cama.
— Em outro momento — disse ela. — Prazer em conhece-lo— murmurou a Justin.
Mas Selena não ia desistir tão facilmente. Seguiu-a até seu quarto. 
— Hey — disse ao fechar a porta atrás dela. — Por que não vem conosco? Demi atirou a bolsa Chanel sobre a cama. Desejou ter sua velha bolsa OldNavy. Não podia suportar ver o reluzente couro preto com as letras C douradas entrelaçadas. Era como levar Joe ao ombro. — Por que não me disse que havia voltado com Justin? Só contamos as más notícias? É assim que funciona?
— Eu queria contar, mas não você não esteve muito receptiva nestes últimos dias.
Demi pensou no seu consumo de cereais, fechada no seu quarto, em como havia se acostumado a ir para a cama às nove em ponto para poder escapar de sua desgraça e acordava no dia seguinte o mais tarde possível para sair correndo ao trabalho.
— Acho que tem razão, sinto muito. E o que aconteceu?
Selena apontou para a sala, onde Justin estava esperando.
— Este não é o melhor momento para falar disso, assim, para resumir uma longa história, eu vou dizer que não resolvemos todos os nossos problemas. Mas encontramos um modo de chegar a um acordo. Demi assentiu.
— Bom, fico feliz por você. Parece um bom rapaz.
— Venha conosco. Andy também é legal. Não pode ficar sentada neste quarto chorando pelo Joseph Jonas o resto de sua vida. Tem que seguir em frente. Ela concordou. Em sua mente, ela o viu olhando para a rua quarenta e dois, esperançoso e decepcionado ao mesmo tempo. Tinha sido mais fácil pensar em seguir adiante quando o culpava, quando via si mesma como a que dava tudo, e a Joe como o vilão do relacionamento que não desejava se aprofundar. Mas ela sabia que ele tinha tentado mostrar, num raro momento de constrangimento, que tentaria lhe dar mais. Agora era ela que tinha percebido de que tinha dado tudo o que podia. E aterrorizava-a pensar que não era suficiente.
Mas aquele não era momento para explicar tudo isso para Selena. Assim que se limitou a dizer:
— Ainda não estou preparada.A expressão de sua companheira se suavizou.
— Ok, entendo. Eu passei pelo mesmo. Mas esta é a última vez que deixo você fugir impune. Direi para o Andy que quer adiar.
Demi deixou a bolsa no chão, deitou-se na cama e se aconchegou de lado. Viu o livro da Bettie Page sobre a penteadeira. Já não o queria em seu quarto, mas não sabia o que fazer com ele. Não tinha coragem para jogar no lixo. Talvez pudesse vende-lo na livraria Strand no dia seguinte. Levantou-se. Levaria o para a sala e deixaria o entre as revistas de moda de Selena, onde não tivesse que vê-lo. Ficou escutando na porta de seu quarto. Não se ouvia nada. Esperou alguns minutos a mais e quando esteve segura de que Selena e Justin se foram, pegou o livro e se dirigiu à sala. Pensando bem, talvez o levasse na livraria Strand nessa mesma noite. Só eram sete horas e não tinha nada melhor do que fazer.
Ela se sentou no sofá, porque decidiu folheá-lo uma última vez.
Era lindo e ela sentia uma fraqueza por belos livros. Passou as páginas até a metade, até o capítulo de fotografias bondage e fetichistas feitas pelo Irving Klaw. Recordou o que Joe lhe havia dito naquela primeira noite no seu apartamento, que Bettie tinha algo que nenhuma das garotas das suas próprias fotos tinha:
"alegria".Demi olhou com atenção a página que tinha na frente dela.Bettie usava um biquíni de estampa de leopardo, os braços e as pernas algemados e uma corda bem escura na boca. Mas sem dúvida, seus olhos estavam sorrindo. "Parece que está se divertindo", ele havia dito. E Demi tinha que reconhecer que era certo. Mas não pôde evitar pensar como era estar realmente nessa posição, a vulnerabilidade, a sexualidade muito real de que isso era o começo. Não sabia como Bettie Page o fez. Talvez na sua vida sexual real não houvesse sido uma submissa e isso lhe permitia interpretar esse papel em frente a câmera. Sua "alegria", sua atitude brincalhona, surgia porque isso era o que tudo aquilo era para ela: um jogo. Não estava mostrando à câmara algo tão real como se estivesse entregando uma parte de si mesmo.Virou as páginas até que chegou ao próximo capítulo: Bettie com umas botas brancas, sacudindo uma vara; Bettie vestida com um espartilho e umas luvas pretas até o cotovelo, agachada em atitude ameaçadora sobre uma mulher vestida com lingerie, deitada de barriga para cima, atada e amordaçada; Bettie com cinta-liga, meias e botas de plataforma que chegavam até os joelhos, amarradas na frente, olhando à câmera com o olhar, como se fosse comer o fotógrafo no almoço; Bettie estalando um chicote. Demi levantou a olhar do livro e teve uma descarga de adrenalina."Não resolvemos todos nossos problemas — disse Selena. — Mas encontramos um modo de chegar a um acordo."E, de repente, Demi soube o que devia fazer.

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